Com a intenção de lançar o edital de concessão do bloco 2 de rodovias - que inclui municípios da região Norte - ainda no primeiro semestre de 2025, o governo do Estado avançou mais uma etapa legal nessa quinta-feira (23) com a realização de uma audiência pública regional em Passo Fundo, no auditório da Faculdade de Direito da UPF. O pacote abrange 32 municípios gaúchos (17,5% da população), tem um total de 414,91 quilômetros de extensão e é composto por sete estradas, incluindo ERS-135, entre Passo Fundo e Erechim, e ERS-324, sentido região serrana. Com o auditório lotado, representantes do Estado ouviram reclamações e reivindicações de moradores locais, que pautaram, sobretudo, o preço dos pedágios.
Os investimentos serão de R$ 6,7 bilhões, sendo R$ 1,3 bilhão via Fundo do Plano Rio Grande (Funrigs), nos 30 anos de concessão com a iniciativa privada. Somente nos dez primeiros anos da concessão serão investidos R$ 4,5 bilhões. Os recursos são necessários para realizar a duplicação de 244 quilômetros e a implementação de 101 quilômetros de terceiras faixas para ampliar a fluidez e a segurança das estradas da região, incluindo também ERS-128, ERS-129, ERS-130, ERS-135, ERS-324, RSC-453 e BR-470. Esses detalhes foram apresentados pelo secretário da Reconstrução Gaúcha, Pedro Capeluppi.
Conforme frisou, nenhuma das rodovias que compõem o Bloco 2 é duplicada. "O alto investimento previsto e a preocupação com a resiliência nas obras das rodovias do Bloco 2 se justificam, pois foram regiões fortemente afetadas pela enchente e contam apenas com estradas de pistas simples hoje em dia”, ressaltou.
A estruturação dos projetos viários também leva em conta obras com foco na resiliência, com 16 pontes em cota elevada e acréscimo de camada drenante nas duplicações, localizadas em áreas afetadas pela enchente. Outras melhorias previstas na concessão são a implementação de 323 quilômetros de acostamentos, 73 quilômetros de marginais e 43 passarelas de pedestres, entre outras medidas. Também estão previstos socorro mecânico e médico 24 horas, monitoramento por câmeras e bases de atendimento aos usuários. A modelagem contou com a parceria do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Sobre os prazos das obras, considerando que são vários conjuntos distintos, afirmou que “os trabalhos iniciais vão acontecer ao mesmo tempo em todos os trechos, que são obras do primeiro ano, antes do início da cobrança dos novos pontos de free flow, justamente para dar para os usuários a qualidade que se espera de uma rodovia concedida”. De acordo com o secretário, para a definição de quais pontos receberão reformas estruturais maiores num primeiro momento, como duplicações e terceiras faixas, foi levado em conta, dentre os aspectos, o tráfego de veículos. “Ou seja, aquelas rodovias que já têm uma capacidade estrangulada, como é, por exemplo, entre Marau e Passo Fundo, esses trechos têm uma prioridade no início das obras”, garantiu. Sobre eventuais desapropriações de terrenos, Capeluppi adiantou que a concessionária é a responsável por fazer a desapropriação e o pagamento aos lindeiros.
“Este custo não pode ser pago por nós cidadãos”, reclama morador sobre pedágios
Nas manifestações públicas feitas durante a audiência, muitas discorreram sobre o custo cobrado e os efeitos para a população das cidades afetadas. Morador de Getúlio Vargas, município entre Passo Fundo e Erechim, às margens da ERS -135, o pastor da Igreja Luterana do Brasil, Flávio Jandt, expressou sua contrariedade à proposta. “Essa rodovia aqui, em 70 quilômetros, comporta municípios pequenos, os quais tentam sobreviver. Muitas pessoas de Getúlio Vargas vêm trabalhar em Passo Fundo e vice-versa, vão a Erechim também, e este custo não pode ser pago por nós cidadãos, por isso que sou contra o pedágio”, argumentou. Como exemplo, citou um caso pessoal. A esposa, contou, trabalha em Sertão. “Em 17 quilômetros, ela vai pagar entre ida e volta quatro pedágios. Imagina pra nossa região o quanto prejudicial vai ser isso, em função de que nossas cidades são pequenas e precisam da ajuda do governo e não nós ajudarmos o governo”. Para ele, as obras necessárias deveriam ser arcadas pelo próprio Estado, considerando a carga tributária já cobrada. “Temos o próprio IPVA, o qual metade fica com o governo estadual e metade vai às prefeituras, e tantas outras coisas em que nós, cidadãos, já pagamos, como o ICMS. Não temos mais de onde tirar”, reclamou Flávio Jandt.
O bloco contará com o sistema free flow, com a cobrança de pedágio em fluxo livre, sem praças físicas. A tecnologia funciona por meio de pórticos instalados nas estradas, que fazem a leitura da placa ou de um chip nos veículos. Serão 24 pórticos instalados nas rodovias do Bloco 2. Nesse modelo, a cobrança é proporcional ao trecho percorrido – estimado em R$ 0,23 por quilômetro rodado. O usuário paga conforme circula nas estradas.
O secretário explicou que a as tarifas são definidas de acordo com o pacote de obras. “É diretamente influenciada com o volume de investimentos. Sobre o número de pontos de cobrança, o objetivo da automatização é justamente proporcionar uma cobrança proporcional ao trecho percorrido pelo motorista. Uma grande crítica ao sistema de concessões atual que temos no Brasil como um todo é que as praças físicas acabam penalizando aquele motorista que anda um curto trecho e acaba passando pelo ponto de cobrança”, comparou.
Municípios pedem ampliação do prazo
Em reunião realizada na manhã de quinta-feira (23), o prefeito de Passo Fundo, Pedro Almeida, recebeu prefeitos da região, membros da Associação dos Municípios do Planalto (Ampla) e o secretário estadual Pedro Capeluppi, para tratar da concessão das rodovias ERS 324 e ERS 135. Dias antes, na terça-feira (21), em reunião com a Ampla, os prefeitos já haviam cobrado um detalhamento, principalmente, acerca dos reflexos econômicos relacionados à concessão e os prazos para a execução de obras, pedindo, ainda, a prorrogação do período voltado às discussões.
Pedro Almeida considerou que a participação dos municípios é indispensável e colocou Passo Fundo à disposição. “É um grande projeto, que vai abranger mais de 400 quilômetros da região norte e contempla investimentos importantes para os próximos anos. Queremos que todos os municípios sejam beneficiados e, portanto, é fundamental que todos possam participar”, enfatizou.
Todas as sugestões foram organizadas em um documento, entregue ao governo estadual durante a audiência. “Precisamos das obras para o desenvolvimento da região, mas temos que debater o que é importante para cada município”, destacou a presidente da AMPLA, Jeanice de Freitas Fernandes. Conforme ela, as tarifas previstas também estão em discussão. “A nossa proposta é que a gente possa rever esses valores. Quem sabe com a possibilidade de um aporte maior de recursos por parte do governo do estado, essa é uma alternativa. E a outra é a formação de uma comissão técnica, juntando profissionais da nossa região com profissionais do governo estadual, para que a gente possa, de fato, analisar as obras contempladas, e consequentemente possa refletir nas tarifas”, acredita Fernandes.
Os municípios compreendidos pela concessão são Erechim, Erebango, Getúlio Vargas, Estação, Sertão, Coxilha, Passo Fundo, Marau, Vila Maria, Casca, Paraí, Nova Araçá, Nova Bassano, Nova Prata, Serafina Correa, Guaporé, Dois Lajeados, Vespasiano Correa, Muçum, Encantado, Arroio do Meio, Lajeado, Cruzeiro do Sul, Mato Leitão, Venâncio Aires, Garibaldi, Carlos Barbosa, Boa Vista do Sul, Westfalia, Teutônia, Estrela e Fazenda Vilanova.
Consulta pública e leilão
A concessão do Bloco 2 está em fase de consulta pública desde o dia 13 de janeiro, o que segue por trinta dias, sendo que as sugestões à futura concessão podem ser enviadas pelo [email protected]. A participação popular contará ainda com outras duas audiências públicas nesta sexta (24), em Lajeado e em Venâncio Aires.
Depois da fase de escuta da sociedade, será lançado o edital (previsto ainda para o primeiro semestre de 2025) e realizado leilão, na B3, em São Paulo, para definir o vencedor da licitação (cerca de 90 dias após o lançamento do edital). O critério para definir o vencedor será o de menor aporte público conjugado com o maior desconto na tarifa.
Petição contra pedágios
Durante a audiência pública, circulou entre a plateia um documento impresso que, por meio de um QR Code, direcionava para uma petição online contra os pedágios.